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Crítica: Tremembé, a Série Que Sanitiza Crimes Reais

A série ‘Tremembé’, disponível na Prime Video, mergulha em uma série de crimes brutais que chocaram o Brasil, incluindo o caso que culminou na morte dos pais de Suzane von Richthofen e o assassinato de Pimenta por Cristian Cravinhos. No entanto, a produção se distancia de uma abordagem crítica e aprofundada, optando por um caminho que beira a espetacularização, levantando sérias dúvidas sobre a responsabilidade ética ao transformar tragédias humanas em mero entretenimento. A narrativa, por vezes, parece mais preocupada em chocar e engajar com reviravoltas do que em explorar as complexidades psicológicas, sociais e as consequências devastadoras para as vítimas e seus familiares. Ao focar nos detalhes mais sensacionalistas, a série corre o risco de banalizar a violência e desviar o foco das discussões importantes sobre justiça, impunidade e os motivos por trás de tais atos hediondos. A própria escolha de atores e a direção de arte, que em alguns casos parecem mais preocupadas com a verossimilhança estética do que com a representação fiel dos personagens e suas angústias, contribui para essa sensação de superficialidade e, para alguns, até de desrespeito. A repercussão nas redes sociais e a cobertura midiática, que incluem desde discussões sobre o direito à herança de condenados até reclamações sobre a escolha de atores, demonstram o fascínio público por esses casos, mas também a linha tênue entre o interesse jornalístico e a exploração do sofrimento alheio. De ex-prefeitos condenados por corrupção questionando suas representações à revelação de detalhes de relacionamentos de condenados, a série acende um debate sobre a linha tênue entre o interesse público e a dignidade dos envolvidos. A decisão de um ex-prefeito condenado por corrupção de expressar descontentamento com a escolha do ator para interpretá-lo, inclusive manifestando o desejo de que Fábio Assunção o representasse, lança luz sobre a dinâmica entre a ficção inspirada em fatos reais e a percepção pública dos envolvidos. Essa reclamação, vista por uns como vaidade, por outros como um reflexo da persistente busca por validação, mesmo em contextos de condenação criminal, adiciona uma camada extra de complexidade à discussão sobre como esses casos são apresentados e recebidos. A questão da herança para criminosos condenados por matar seus pais ou cônjuges, como abordado em alguns veículos, é outro ponto crucial que a série poderia ter explorado com mais profundidade, abordando as leis de sucessão e os impedimentos legais para tais beneficiários, um debate que transcende o sensacionalismo e adentra o campo jurídico e ético. A série ‘Tremembé’ falha ao não conseguir equilibrar o fascínio pelo macabro com a sensibilidade necessária. Em vez de promover uma reflexão crítica sobre a violência e suas causas, a produção se perde em detalhes que parecem ter como único objetivo o choque, correndo o sério risco de criar um espetáculo em cima de tragédias que mereciam um tratamento mais respeitoso e analítico. O impacto cultural dessa abordagem para a compreensão da criminalidade e suas raízes sociais e psicológicas é, no mínimo, questionável e merece um debate mais amplo e profundo, longe das luzes sedutoras e muitas vezes enganosas do entretenimento massificado, especialmente considerando a tendência de desinformação e a mercantilização da violência que permeia a era digital, onde até crimes horrendos podem ser transformados em temas virais.