Quase 70% do orçamento das polícias em Minas Gerais foi para a Militar em 2023, diz estudo

Segundo levantamento do Justa, além de baixo investimento em investigações criminais, orçamento anual não tinha previsão para políticas exclusivas destinadas a quem saiu do sistema prisional. Viatura da Polícia Militar de Minas Gerais
Raquel Freitas/TV Globo
Minas Gerais foi o terceiro estado do país que mais gastou, em números absolutos, com polícias em 2023. Foram R$ 7,8 bilhões do orçamento destinados a essa finalidade, sendo que quase 70% desse valor ficou com a Polícia Militar (PM), segundo estudo do centro de pesquisa Justa.
No sistema prisional, o estado aplicou R$ 2,6 bilhões, mas, de acordo com o levantamento, não houve previsão orçamentária para políticas exclusivas destinadas a quem saiu da cadeia. Procurado pelo g1, o estado destacou que investiu R$ 6,5 milhões em um programa para egressos (leia mais abaixo).
Para o advogado e coordenador de advocacia do Justa, Felippe Angeli, é preciso mudar a lógica de investimentos em segurança pública para que o combate ao crime funcione de fato no estado e no país.
“A gente vê uma prioridade ao policiamento ostensivo, à ideia de segurança pública na perspectiva de combate e guerra, que tem resultados muito pífios. Embora o policiamento ostensivo seja importante para a manutenção da ordem pública, acaba resultando no combate a crimes menos complexos, pequenos furtos, pequenos flagrantes, que lotam as cadeias. [O combate a] crimes mais complexos, que demandam inteligência, é subfinanciado”, afirmou.
Somente São Paulo e Rio de Janeiro investiram mais do que Minas Gerais em polícias no país em 2023 (veja na tabela abaixo).
Gastos com polícias, sistema penitenciário e política para egressos por estado
Segundo o Justa, os gastos com policiamento no estado superam o orçamento destinado a áreas como ciência e tecnologia (R$ 539 milhões) e gestão ambiental (R$ 292 mi).
No entanto, dos quase R$ 8 bilhões distribuídos para as polícias, a Polícia Civil, responsável pelas investigações criminais, recebeu R$ 2,1 bilhões.
Na avaliação de Angeli, os baixos investimentos na produção de provas e na análise de vestígios de crimes contribuem para a sensação de impunidade.
“Os grandes crimes não são resolvidos e, quando chegam ao judiciário, como não há produção de prova, muitas vezes os suspeitos acabam sendo liberados, e isso gera a noção de impunidade. A gente tem um investimento brutal no policiamento, principalmente na PM, mas a sociedade sabe que não está funcionando. Estamos gastando rios de dinheiro, e o resultado está aí”, falou.
Em 2023, Minas Gerais registrou 2.946 homicídios dolosos, 74 latrocínios e 24 casos de lesão corporal seguida de mote, segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, uma média de 253 mortes intencionais por mês.
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Sistema prisional
Outro problema, segundo o advogado Felippe Angeli, é a falta de orçamento específico para políticas voltadas para egressos do sistema prisional.
O cenário se repete em todo o país, onde, a cada R$ 1.252 gastos com o sistema penitenciário, R$ 1 é investido em políticas exclusivas para pessoas que deixam as prisões.
“A gente tem que entender que, no Brasil, não há prisão perpétua. Todo mundo que está no sistema prisional, e é muita gente, vai sair um dia. E, da forma como os presos estão ali, submetidos a um tratamento absolutamente medieval, o que nós estamos fazendo é financiar facções criminosas com dinheiro público”, afirmou o advogado.
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Daniel Protzner/ ALMG
Segundo Angeli, as organizações criminosas oferecem aos detentos, dentro das prisões, a estrutura que o estado muitas vezes não garante – proteção, apoio jurídico e produtos de higiene, por exemplo.
“Os presos saem em dívida com as facções criminosas e sem nenhum amparo do estado. […] São, na maioria, homens, jovens, em geral presos por tráfico de drogas, pequenos furtos, roubos, que estão ali em uma situação extremamente degradante. E, quando saem, não há nenhum investimento. É um prato cheio para as facções, que explodiram ao longo das últimas décadas”, destacou.
De acordo com o estudo do Justa, os R$ 2,6 bilhões investidos no sistema prisional mineiro em 2023 ultrapassam os valores destinados a áreas como assistência social (R$ 173 milhões) e cultura (R$ 128 mi).
O que diz o estado
Em nota, o governo de Minas Gerais afirmou que “os investimentos na polícia investigativa estão cada vez mais fortalecidos no estado”.
Segundo o Executivo, em 2023, foram investidos mais de R$ 5 milhões em equipamentos e sistemas de inteligência, ações de prevenção e repressão à violência escolar, além de mais de 20 operações integradas da área.
Ainda de acordo com o governo mineiro, a Polícia Civil “tem expandido a metodologia de trabalho do Laboratório de Tecnologia de Combate à Lavagem de Dinheiro, focando no confisco de ativos de organizações criminosas”.
“Ressaltamos, ainda, que a PCMG segue trabalhando de forma contínua e ininterrupta, para a melhoria dos trabalhos de investigação e atendimento ao cidadão, especialmente no que tange aos crimes contra a vida”, afirmou o estado.
Em relação ao sistema prisional, o estado destacou o Programa de Inclusão Social de Egressos do Sistema Prisional (PrEsp), desenvolvido desde 2003.
Segundo o governo, o PrEsp está presente em 15 municípios. Ele recebeu R$ 6,5 milhões em investimentos e realizou 22.968 atendimentos, em 2023.
“Além de realizar atendimentos e acompanhamentos às pessoas egressas do sistema prisional (o que envolve acolhimento de demandas e orientações, encaminhamentos para instituições da rede de proteção social, capacitação profissional, entre outros tipos de atividades), também são desenvolvidos trabalhos com público pré-egresso (pessoas que estão presas e que possuem previsão de saída em 6 meses)”, disse a nota.
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